Os dons revelacionais são para hoje? Esta é uma discussão que perdura a pouco mais de um século, desde que o Pentecostalismo surgiu. Deste movimento surgiram ramificações como os Carismáticos e a Terceira Onda, mas basicamente todos os três grupos defendem a continuidade da revelação especial em seu modo proposicional. Quanto à cessação da revelação especial extra-bíblica deve-se observar os seguintes pontos:
1. Os dons revelatórios existiram com a finalidade de suprir e complementar a Escritura que estava em processo de registro. Quando o cânon fechou, isto é, [Apocalipse] o último livro foi escrito toda comunicação extra-bíblica cessou tendo como evidência a não continuidade de novos livros inspirados. Por exemplo, um dos critérios de canonicidade era que o livro deveria ser escrito por um apóstolo, ou alguém autorizado por um apóstolo [por ex., Lucas e João Marcos]. Os apóstolos cessaram, por que a sua principal função deveria continuar e com que propósito?
2. Somente a Escritura Sagrada é a Palavra de Deus. Se novas revelações fossem "Palavra de Deus" [alguns faladores de línguas e ditos profetas declaram: "assim diz o Senhor"] então qual seria o problema de se exigir que estas "novas revelações" fossem escritas em papel. E, sendo escritas deveriam ser inclusas na Bíblia? (Ap 22.18-20; Gl 1.6-9).
3. Cremos que toda a Escritura é inspirada e suficiente para salvar e santificar-nos (2 Tm 3.16-17). Com que finalidade Deus daria revelações adicionais se a Escritura é a nossa única regra de fé e prática? Se crermos que existem outras revelações sendo entregues além da Escritura então, a Bíblia deixa de ser a nossa única regra de fé e prática, e, então, teremos que nos submetermos à autoridade destas novas revelações com a mesma reverência e temor que temos pela Escritura Sagrada.
4. A falta de veracidade e falibilidade dos faladores de língua e dos tais profetas é uma prova de que não procedem de Deus. A Escritura quando estava sendo revelada foi exigido a sua veracidade e cumprimento das profecias como testemunho da sua fidedignidade (Dt 18.20-22). Os atuais reveladores apelam para a subjetividade não verificável e ao emocionalismo irracional, bem como à "falta de fé" do indivíduo para justificar o não cumprimento da dita profecia! Parece-me que o cumprimento da profecia não dependia que o individuo receptor cresse nela ou não, porque ela se cumpriria pelo simples fato de que Deus determinara revelar a Sua vontade e determinação antecipadamente, não condicionando à fé do receptor, mas ao Seu propósito soberano.
5. O dom de língua na Escritura é um idioma de algum povo que não foi aprendido, e que o falador de línguas no NT era capacitado pelo Espírito Santo para comunicar a profecia e realizar a pregação do evangelho de modo sobrenatural. Se o dom de línguas era a pronunciação de grunidos e sons ininteligíveis como pretendem e entendem os que creêm hoje falam em línguas, onde está o seu caráter sobrenatural? Afinal qualquer um pode pronunciar um emaranhado de sons e repetí-los sem significado algum, ou atribuir-lhes o sentido [ininteligível] que quiserem! Como o ouvinte [de origem alemã, francêsa, italiana, inglesa, etc] poderá ouvir falar em sua própria língua se o dom de língua são meros sons inarticulados sem sentido algum? Que evangelho será comunicado, ou "nova mensagem" poderá ser entendida pelo ouvinte?
6. Dizer que o dom de língua de At 2 é de natureza diferente do dom de 1 Co 12-14 é aceitar que a Bíblia ensina dois tipos de dons de línguas. Apesar da lógica ser óbvia ela é geralmente evitada. A tendência de se interpretar At 2 como um dom de língua sendo idioma [pela sua incontestabilidade At 2.6, 8, 11] e 1 Co 12-14 como sendo "um dom de língua" ininteligível, não se sustenta pela falta de evidência da ênfase de Paulo em dizer que o dom tanto de profecia como de línguas são revelatórios, isto é, são mensagens claras e inteligíveis vindas inconfundivelmente de Deus. Aceitar que existam 2 tipos de dons de línguas no NT é aceitar que Deus se comunica de forma inteligível e objetiva e ao mesmo tempo de forma ininteligível e subjetiva! Entretanto, não há indicação nos escritos do apóstolo Paulo desta estranha distinção.
Creio que estes são alguns pensamentos necessários para que possamos examinar as Escrituras [como um crente bereano] e além da sinceridade ser também verdadeiro em nossas conclusões e fiéis ao Senhor em tudo. Indico a indispensável leitura de algumas obras sobre o assunto:
1. Alderi S. de Matos, et al., Fé Cristã e Misticismo (São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2000).
2. Richard B. Gaffin, Jr., Perspectives on Pentecost (Phillipsburg, P&R Publishing Co., 1979).
3. Gordon H. Clark, The Holy Spirit (Jefferson, The Trinity Foundation, 1993).
4. Victor Budgen, The Charismatics and the Word of God (Faverdale North, Evangelical Press, 2001).
5. Donald Macleod, El Bautismo con el Espíritu Santo (San José, CLIR, 2002).
6. Edwin Palmer, El Espíritu Santo (Edinburgh, El Estandarte de la Verdad, 1995).
7. O. Palmer Robertson, A Palavra Final (São Paulo, Editora Os Puritanos, 1999).
8. Sinclair B. Ferguson, O Espírito Santo (São Paulo, Editora Os Puritanos, 2000).
9. Errol Hulse, O Batismo do Espírito Santo (São José dos Campos, Editora Fiel, 1995).
10. John R.W. Stott, Batismo e Plenitude do Espírito Santo (São Paulo, Edições Vida Nova, 1993).
11. Wayne Grudem, ed., Cessaram os Dons Espirituais? (São Paulo, Editora Vida, 2003).
12. Frederick D. Bruner, Teologia do Espírito Santo (São Paulo, Edições Vida Nova, 1989).
13. John MacArthur Jr., Os Carismáticos (São José dos Campos, Editora Fiel, 1995).
Rev. Ewerton B. Tokashiki
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